07/05/2012 - O Manthiqueira, clube-empresa da cidade de Guaratinguetá (a 175km da capital São Paulo), estreou com o pé direito na quarta divisão do Campeonato Paulista no último domingo. O time venceu o Ecus, fora de casa, por 2 a 0. O jogo poderia passar despercebido não fosse a novidade à beira do gramado: a técnica Nilmara Alves (foto), primeira mulher a comandar um clube profissional no Estado de São Paulo (a pioneira no Brasil foi Cláudia Malheiro, no Andirá-AC). Fã de Muricy Ramalho , treinador do Santos, e aprendiz da filosofia de jogo de Josep Guardiola, doBarcelona , Nilmara ficou muito satisfeita com o resultado, e vê sua equipe na luta para chegar à Série A3 do Paulistão.
"Acreditamos muito no acesso à Série A3. A gente sabe do potencial da nossa equipe e dos nossos jogadores. Estamos trabalhando muito para que isso aconteça", disse ao iG a treinadora, de voz grossa e discurso firme, bem ao estilo Muricy. "Ele é uma pessoa muito centrada nas coisas que fala. É um grande profissional, vencedor e me inspiro muito nele", afirma a paulista de Aparecida, que também tenta aplicar uma filosofia catalã - inclusive com a proibição de "dancinhas" nas comemorações - no Manthiqueira, clube de apenas seis anos e com uniforme laranja inspirado na seleção holandesa. O mascote do clube é um cavalo, homenagem à história de Guaratinguetá, marcada pelos tropeiros que cruzavam o Vale do Paraíba. Já o nome vem da Serra da Mantiqueira.
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Formada em educação física e também no curso de treinadores, Nilmara trabalhou como preparadora física do Manthiqueira antes de receber o convite do presidente Dado de Oliveira para dirigir a equipe. Aceitou na hora. Segundo ela, os jogadores (que a conhecem desde quando o clube ainda nem era profissional) mostram total apreço pela chefe. "Eles me respeitam, conhecem o meu trabalho e sabem do meu potencial. Estamos juntos há tempos e 'fechados'. Eles me tratam como uma profissional do futebol", comenta a treinadora, que só separa dos atletas quando eles precisam se trocar no vestiário. Ela vive no CT do clube (que tem dormitórios, ambulatório, consultório odontológico e refeitório), na zona rural de Guaratinguetá.
Com o emprego assegurado pelo presidente Dado de Oliveira até o fim do Paulista Segunda Divisão (o campeonato acaba em 21 de outubro), Nilmara - que ainda joga futebol feminino e crê na recuperação do esporte no Brasil - tem total tranqüilidade para trabalhar e colocar seu projeto em prática. Calma, ela já está preparada para ouvir provocações dos torcedores durante o torneio, mas diz relevar. Na partida contra o Ecus, ela não sofreu com o problema, já que o jogo foi realizado com portões fechados. "O que importa para mim é ter a confiança do presidente e dos jogadores", diz.
Confira abaixo o bate-papo que ela manteve com o iG Esportes.
iG: Como foi estrear com vitória? Já pensa no acesso ou ainda é cedo
Nilmara: Estou muito feliz! A gente sabia que jogar fora de casa seria complicado, ainda mais contra uma forte equipe, mas a gente foi confiante para a partida e, graças a Deus, saiu com a vitória e com os primeiros três pontos no campeonato. Acreditamos muito no acesso à Série A3. A gente sabe do potencial da nossa equipe e dos nossos jogadores, e estamos trabalhando muito para que isso aconteça.
iG: Como pensa em lidar com as provocações dos torcedores? Nilmara: Hoje (domingo) o jogo foi com portões fechados e não teve torcida, então não teve nenhum problema com isso. Mas sou tranqüila, não ligo para provocações. O que importa é os jogadores e o presidente confiarem em mim. Os jogadores do time adversário também se comportaram bem. Devem ter achado um pouco estranho, pois nunca devem ter jogado contra uma equipe com uma mulher no comando. Mas não teve nenhuma reação negativa por parte deles e correu tudo bem.
iG: Como você se tornou técnica de futebol? Quem te apoiou? Nilmara: Eu jogo futebol desde os 15 anos e sou formada em educação física. Já fiz curso de treinador e trabalhei como técnica em Aparecida (sua cidade natal), nas categorias de base de equipe masculina, e ano passado trabalhei como prepradadora física do Manthiqueira. Acabei recebendo o convite neste ano para trabalhar como treinadora e aceitei o desafio. Meus grandes apoiadores foram o treinador do Aparecida, meu amigo Luís Fernando, o presidente Dado (de Oliveira, do Manthiqueira), que me conhece bem e acredita no meu trabalho, além dos meus amigos e familiares.
iG: Você se inspira em algum técnico de sucesso? Nilmara: Eu gosto muito do Muricy Ramalho. Ele é uma pessoa muito centrada nas coisas que fala. É um grande profissional, vencedor e me inspiro muito nele. Também sou fã do (Josep) Guardiola (treinador do Barcelona), pois ele usa o esquema tático parecido com o nosso, que visa a posse de bola, toques rápidos e curtos, cadência do jogo, marcação leal e pouco "chutão". Hoje (domingo), por exemplo, os jogadores cumpriram bem tudo o que foi passado. Trabalhamos bem a posse de bola, a movimentação, sem dar chutão, e isso nos deu o resultado positivo.
iG: Você conhece alguma outra técnica de futebol? Acha que será uma inspiração? Nilmara: Teve uma técnica que trabalhou no Andirá, do Acre (Cláudia Malheiro, em 2000), mas não conheço muito a história dela. Com equipe profissional, sou a segunda no Brasil, mas a primeira no Estado de São Paulo. Acho que vou inspirar outras mulheres, sim. É um primeiro passo para que outras possam seguir o meu exemplo. Torço por isso.
IG: Como é sua relação com os jogadores? Nilmara: Eles me respeitam bastante, conhecem o meu trabalho e sabem do meu potencial, assim como eu sei o deles. Isso é muito gratificante. Eu e os atletas estamos juntos há tempos, eles sabem que podem contar comigo e eu com eles. Isso é muito importante num time de futebol. É um primeiro passo positivo para a equipe e para a busca do acesso. Eles me respeitam e me tratam como uma profissional do futebol.iG: E como fica na hora do vestiário? Você tem liberdade total? Nilmara: A gente já está bem treinado na questão do vestiário (risos). Eles (atletas) entram, trocam de roupa e fazem o que têm que fazer. Aí eu dou um tempo, entro e dou a preleção. Assim, tudo flui normalmente, sem constrangimento. Na preleção, gosto de dar incentivo e conversar, dar muito apoio. Falo para eles colocarem em prática tudo o que treinamos durante a semana. Futebol não tem segredo. |
iG: Você acha que o futebol feminino no Brasil tem alguma chance de crescer? Nilmara: O futebol feminino está muito abaixo do esperado, sem dúvida. É só você ver que as melhores jogadoras estão todas tendo que sair do país para ter incentivo, apoio e um time fixo. Mas acredito que, no Brasil, o esporte tem potencial para crescer. Eu ainda jogo futebol quando posso e gosto muito. Se um dia surgir uma oportunidade, quero trabalhar como técnica no futebol feminino também.
iG: Onde acha que pode chegar como treinadora? Nilmara: A gente sempre espera um dia chegar ao lugar mais alto, que é treinar uma equipe forte, de primeira divisão nacional. Isso é um sonho. Mas, por enquanto, estou trabalhando firme e muito concentrada aqui no Manthiqueira, com os pés fincados no chão. O que tiver que acontecer vai acontecer naturalmente.
Fonte da entrevista: IG Esportes - Fotos Divulgação
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